Ela, que aqui chamarei de Sofia, pronuncia a seguinte frase: Não quero mais viver, meu marido não gosta mais de mim. Qual o sentido dessa frase?
Sofia fala de desejo, do seu desejo. Muito embora remeta a seu marido o sentido de desejá-la, de gostar dela. Pode-se dizer a Sofia uma série de coisas no intuito de provocar uma mudança no seu intuito de não mais viver. Porém, só um questionamento será capaz de provocar uma transformação em sua vida. Esse questionamento deverá de algum modo alcançar sua subjetividade e posicioná-la diante do desejo inconsciente que a põe em movimento.
O que diz Sofia afinal com aquela frase? Muitas coisas. Diz por exemplo que sua referência enquanto ser está calcada no outro, seu semelhante e que ela se aguenta na vida a partir de o outro a desejar, gostar dela. Sua frase revela o quanto está sua vida baseada naquilo que o outro é capaz de a fazer sentir enquanto ser. Seu ser repousa no obscuro campo de desejo de um outro que provavelmente não sabe também dizer o que é.
Sofia apenas sente que não quer mais viver porque simplesmente seu marido não gosta mais dela. Ela vivia do desejo dele, do gosto dele. Sua medida de gozo e prazer na vida estavam condicionados aos desdobramentos do que se passava com ele, nele. Duas vidas, sendo que a vida de Sofia, fundida na vida de seu marido, sua referência única, já que sem ele a vida não quer mais viver. Colados, Sofia e seu marido constituíam uma unidade chamada casal, um par, agora já não serão mais dois senão um só corpo, um só coração, frase ouvida no dia do seu casamento.
Essa pretensa unidade, só alcançada na loucura da fantasia imaginária, acaba se dissolvendo para Sofia quando capta em seu marido um símbolo qualquer de seu desinteresse. Seu mundo cai, não quero mais viver…
Quanto ao seu marido, não podemos dizer muita coisa. Estamos apenas desdobrando uma frase que poderia ser dita por qualquer um. Há muitas outras frases. O fato é que Sofia poderia ter reagido de outras maneiras, tais como: brigar com seu marido, ficar com ciúmes e perseguí-lo, agredi-lo, aceitar o fato e separar-se, tentar reconquistá-lo, ignorar o desinteresse dele, enlouquecer, etc…
O fato é que ela diz: não quero mais viver… O que nos interessa nessa frase de Sofia é mostrar que a sexualidade nos seus descaminhos revela de que forma serão constituídos os relacionamentos e o que pode provocar alguns símbolos, detalhes, palavras que indiquem alguma diferença, alguma separação. Isso pode até se tornar perigoso. Não são poucos os casos que acompanhamos nos jornais onde uma separação acaba tendo um fim trágico. Não precisa ser assim!