O corpo procura complemento para suas faltas. Será possível o encontro com esse complemento? O corpo é aberto. Poros, olhos, nariz, boca, genitais masculinos, genitais femininos, ânus, ouvidos, formam um conjunto de aberturas que constituem o corpo. O corpo é uma constituição de buracos. Em psicanálise os chamamos de zonas erógenas. São partes do corpo marcadas por algum tipo de satisfação específica e que constantemente estão pedindo novos prazeres. Esse é o corpo erógeno com o qual nos relacionamos com o outro sexo. Em resumo, o relacionamento só se faz possível porque temos um corpo furado, cheio de buracos que pedem objetos obturadores.
Às vezes acontece de alguém ter um cheiro marcante e isso produz uma sensação de prazer olfativo e enquanto o cheiro (alguém) está presente parece que o espaço (buraco, furo) olfativo está completo, foi preenchido. Basta o cheiro se afastar e logo (re)surge a sensação angustiante da falta daquele cheiro (alguém) para completar ou para fazer reviver a sensação de prazer causada pela presença do objeto.
Às vezes acontece que além do cheiro, uma pessoa se torna importante porque há também a voz, o tato, o olhar, as coisas que agradam os olhos, as coisas que se ouvem, há o sexo, os ritmos do corpo, os formatos das áreas genitais, a forma de se fazer o sexo, as lembranças de momentos vividos, os toques dados e recebidos. Tudo isso e certamente muitas outras (cada um pode pensar nos seus relacionamentos) fazem com que o corpo tenha a impressão de uma completude. A pretensão é que esse prazer, que essa ‘completude’ dure para sempre. Mas o tempo é cruel. E, por mais que se tente eternizar certos momentos, o tempo separa os amantes, seja para que um deles vá dormir em sua casa e os amantes só possam se encontrar no dia seguinte, seja por tempos maiores em casos de viagens, trabalhos…
E aí o corpo se vê abandonado à solidão. A descrição dos amantes é que parte de si foi levada embora e a outra parte é angústia. É vivência de angústia. O sofrimento é proporcional ao tamanho da paixão encontrada pelo corpo em outro corpo. Quê dizer aos amantes? O tempo e as palavras acabam amenizando a dor da separação até que novo encontro traga a esperança de que algo se torne eterno. Ainda assim, o tempo vem junto dizendo que esse encontro tem duração programada. É a castração imposta pelo tempo, que muitos suportam, apesar das lágrimas e outros, não. Afinal o que quer o corpo?